A Revised Psycopathology of the Psychoses and Psychoneuroses
Ronald Fairbairn (1941)
Neste texto Fairbairn propõe uma revisão de diversos conceitos clássicos psicanalíticos apoiando-se na sua experiência com pacientes esquizoides. Começa propondo que a esquizoidia está mais presente nos pacientes do que faz parecer, enxergando um background esquizoide em diversas manifestações de ansiedade, fobia, histeria e obsessões. Para ele a principal característica da esquizoidia é a presença de cisões no ego.
Fairbairn faz um profundo mergulho na teoria dominante sobre a libido para chegar a uma de suas mais conhecidas contribuições: a de que a libido é, prioritariamente voltada à busca pelo objeto [object-seeking]. Retoma a revisão da teoria das fases da libido de Abraham e concorda que a esquizoidia advém de uma fixação na primeira fase oral. Mas rompe com Abraham quando enxerga a fixação na fase oral também em episódios paranoicos, obsessivos, histéricos e fóbicos.
“É quando substituímos “fase das fezes” por “fase anal” que a limitação do esquema de desenvolvimento libidinal de Abraham se apresenta; isso porque, enquanto o seio e os órgãos genitais são natural e biologicamente objetos da libido, as fezes certamente não o são. Ao contrário, são apenas um objeto simbólico. São apenas, por assim dizer, o barro a partir do qual um modelo do objeto é moldado.”
Propõe então que a teoria clássica da libido seja transformada numa teoria do desenvolvimento baseada nas relações de objeto, já que a teoria presente “confere status de atitudes libidinais a várias manifestações que são, na verdade, meras técnicas regulatórias das relações de objeto do ego.”
“O objetivo último da libido é o objeto”, e ela busca o caminho de menor resistência - momento no qual aparecem as zonas erógenas. Pensar ao contrário é colocar o carro na frente dos bois. Afinal, não há paciente que atingiram a organização da fase genital, mas mesmo assim não se relacionam de maneira madura com os objetos? “Por que o bebê chupa o dedo”, pergunta clássica de Fairbairn, cuja resposta ele dá: “Porque não há um seio para ser sugado”. O chupar de dedo é uma técnica para lidar com uma relação objetal insatisfatória.
A relação de objeto determina a atitude libidinal, e não o contrário. “[…] todo o curso do desenvolvimento libidinal depende de quais objetos são incorporados e da natureza das técnicas empregadas ao lidar com esses objetos incorporados.”
Se é a qualidade da relação que determina a atitude libidinal, pensa Fairbairn, o Édipo não pode ser considerado como intrínseco ao inconsciente, mas fruto de relações objetais; é um fato sociológico, não psicológico.
A transição da fase oral se dá quando o objeto passa a ser dicotômico, dividido entre o objeto aceito e o objeto rejeitado, de onde derivaria uma atitude também dicotômica do bebê, entre abandonar e também retornar à posição de dependência infantil. Com a ideia de dependência infantil (antecipando Winnicott), Fairbairn relega a atitude libidinal ao segundo lugar, dando foco ao “conflito entre uma extrema relutância em abandonar a dependência infantil e um desesperado anseio de renunciar a ela.” Esse é o grande conflito da fase de transição à independência (sempre relativa para Fairbairn).
O autor em seguida explora as relações de objeto das “técnicas" obsessiva, paranoico, histérica e fóbica.
Continuando sua revisão psicopatológica, nosso autor postula que o indivíduo sadio, ao perder um objeto, tem outros objetos com os quais se relacionar, enquanto o indivíduo patológico não abandonou a identificação com os objetos, então perde uma parte de si ao perder o objeto. O desenvolvimento é um processo de progressiva diferenciação do objeto.
Fairbairn oferece um precioso resumo da esquizoidia versus depressão: na primeira fase oral (sugar ou rejeitar; pré-ambivalente) o dilema do bebê se constitui como “sugar ou não sugar”, ou “amar ou não amar”. Na segunda fase oral (sugar ou morder; ambivalente), o dilema se coloca como “sugar ou morder” ou "amar ou odiar”. A primeira fase então é a esquizoide e a segunda a depressiva. Vejamos como o conflito esquizoide é trágico, já que seu amor é que pode matar, enquanto no conflito depressivo quem mata é o ódio.
Nos indivíduos esquizoides o ego então renuncia à libido, “renunciando à forma mesma de energia que o mantém unido.” Já o depressivo nunca sente que seu ódio pode matar o objeto, então não precisa renunciar à libido. Mas mesmo assim o desenvolvimento não está completo porque o depressivo não atingiu a dicotomia do objeto, fase na qual poderia direcionar sua destrutividade ao objeto rejeitador e seu amor ao objeto aceitador. Portanto o depressivo também não superou totalmente a identificação com o objeto infantil.
Para Fairbairn, todo paciente pode ser pensado na dicotomia esquizoide/depressivo.
In FAIRBAIRN, W. R. D. "Psychoanalytic Studies of the Personality". Londres: Routhledge, 1952.